Categories: Edição 02

A Ausência de uma Identidade Profissional

A AUSÊNCIA DE UMA IDENTIDADE PROFISSIONAL AUTÔNOMA E PLENA NO DESIGN DE INTERIORES

Os reflexos no ensino, na pesquisa, no mercado e a identificação de sua origem

Autor

Paulo Roberto Gonçalves de Oliveira

Resumo

Considerando como objetivo deste estudo evidenciar os entraves e as possibilidades para o resgate e o fortalecimento da identidade do profissional designer de interiores e ambientes, os fundamentos teórico-práticos pertinentes necessários para o pleno exercício profissional relacionado com a construção da identidade do designer de interiores de forma autônoma, este artigo faz uma análise da atual situação relacionada à percepção social reduzida e a auto identificação dos profissionais da profissão Designer de Interiores e Ambientes. Busca-se portanto, através de levantamento bibliográfico e documentos oficiais, identificar onde estão e quais são os problemas geradores de distorções que atingem – e prejudicam – a área e propõe, por fim, um modelo para superar tais dificuldades.

Palavras-chave: Design de Interiores; Identidade; Exercício profissional; Profissão.

Abstract

Considering that the objective of this is study is to highlight the obstacles as well as the possibilities for the rescue and strengthening of the identity of interior designer, and the relevant theoretical and practical fundamentals that are necessary for the broad exercise of professional activity related to the construction of the identity of the autonomous interior designer, this article offers an analysis on the current situation related to the reduced social perception and self-identification of Interior Designers. Therefore, through bibliographic research and official documents, to identify the problems that generate such distortion in this area and to propose a model that would overcome such difficulties.

Keywords: Interior Design; Identity; Professional exercise; Profession.

1. Introdução

Após mais de 20 anos de luta pelo reconhecimento social do Design de Interiores, no Brasil, a regulamentação de seu exercício profissional se deu através da Lei n° 13.369, de 16 de dezembro de 2016. Apesar dos avanços da área, esse período foi marcado pela resistência e ofensivas corporativistas de setores contrários com intuito estratégico de impedir aos profissionais dessa área a liberdade para o pleno exercício profissional e para a afirmação de sua identidade de forma autônoma. De modo diverso, em boa parte dos países desenvolvidos, a identidade do designer de interiores tem seu reconhecimento social devidamente regulamentado e consolidado: desde o século XIX na França, pelo Conseil Français des Architectes d’Intérieur (CFAI), e no século XX, nos Estados Unidos, pelo National Consil for Interior Design Qualification (NCIDQ) entre outros.

Atualmente, no Brasil, de acordo com estatísticas realizadas pela Associação Brasileira de Design de Interiores (ABD), estima-se que existam aproximadamente 80.000 profissionais habilitados nos mais de 180 cursos espalhados pelo país nos níveis de formação – técnicos, tecnólogos e bacharéis – sem contar aqueles ainda discentes. A formação acadêmica na maioria dos cursos, ofertados em âmbito nacional, negligencia aos alunos o real conhecimento sobre o vasto campo de possíveis atuações na área de Design de Interiores e, por sua vez, restringe o reconhecimento de sua identidade profissional, diferente do que acontece no exterior conforme constata-se nas entidades internacionais representativas como Associação Portuguesa de Designers (ADP), International Interior Design Association (IIDA), nas supracitadas CFAI e NCIDQ entre outras. Essa situação se agrava quando, na regulamentação promovida pela Lei n° 13.369/2016, de 16 de dezembro de 2016, a exigência de formação acadêmica para o exercício profissional foi equivocadamente vetada pelo Presidente da República Michel Temer o que indica claramente, não apenas uma compreensão distorcida a respeito desta profissão – reduzida a uma mera prática decorativa, mas para atender, nos bastidores, o lobby corporativista dos que intencionavam impedir esta regulamentação.

1 Por questões culturais, os franceses têm uma tendência em rejeitar palavras estrangeiras. Por isso a adoção do termo architectes que é empregado no lugar de design. No entanto, analisando os currículos dos cursos e as atribuições profissionais, fica evidente que se trata da profissão de Interior Design.

Na contramão dos avanços internacionais, as práticas curriculares dos cursos de Design de Interiores, no Brasil, ainda permanecem focadas no desenvolvimento massivo de projetos técnicos onde os elementos fundamentais do processo de Design são tratados superficialmente ou, senão, negligenciados, sendo que não abrangem a amplitude e a complexidade teórico-prática do Design de Interiores considerando sua raiz – o Design – e a principal premissa, trazida do Design: detectar e solucionar problemas que envolvem a interface entre o usuário com os diversos espaços ou objetos por ele utilizado.

Por um lado, boa parte dessa problemática sobre os designers de interiores e sua identidade profissional pressupõe uma reiterada distorção que afeta sua configuração curricular. Por exemplo, é manifesto que a História do Design de Interiores nos cursos, apresenta-se submetida às narrativas reducionistas que desvirtuam a compreensão dessa área profissional por conta de sua vinculação imposta forçosamente à História da Arquitetura, reflexos do pensamento bauhausiano (GROPIUS, 2004; WOLFE, 1981, entre outros) que dizia, em outras palavras, que “Tudo é Arquitetura, tudo depende da Arquitetura”. Este pensamento vem do período entre 1919 a 1933. É preciso evoluir e aceitar as mudanças ocorridas até chegar na atualidade afinal, o mundo de hoje é outro, no rol de profissões atuais não constam apenas aquelas existentes no referido período. Muitas sumiram, outras adaptaram-se e dividiram-se. Novas surgiram demonstrando que, através de uma séria análise historiográfica, sempre se fizeram presentes na história da humanidade através de práticas vernaculares – aqui aparecem lastros claros sobre o Design e suas especialidades – incluindo Interiores.

Fato é que a principal bibliografia nacional sobre Design de Interiores tem sido elaborada, até o momento, por profissionais de outras áreas correlatas, a maioria sem formação abrangente ou especializada em Design de Interiores e, por essa razão, descompromissados com a construção da identidade da área. Entretanto, considerando a pesquisa e a produção internacional, tais como FORTY (1986), GIBBS (2009), SUDJIC (2008) entre outros, observa-se uma abordagem histórica e funcional mais ampla da profissão. Outros aspectos semelhantes reforçam os entraves curriculares e político-educacionais que limitam gravemente as mediações formativas necessárias para a apropriação significativa mais ampla de saberes, competências e habilidades, atribuições adequadas e possíveis para o pleno exercício profissional, antenada com os padrões internacionais mais avançados e às exigências do mercado.

Por outro lado, importa ressaltar que, no âmbito da política educacional na esfera federal, há mais de uma década, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) tem dificultado a autorização para a abertura de cursos específicos de Design de Interiores em nível de bacharelado, necessários estrategicamente para alcançar e impulsionar, em médio e longo prazo, uma produção científica em âmbito de pós-graduação stricto-sensu e capacitar docentes e pesquisadores especializados para o ensino superior – a maioria dos docentes nos cursos atuais não são graduados em nenhuma especialidade do Design e poucos possuem especialização em alguma área do Design. Hoje, no Brasil, inexistem programas de Mestrado ou Doutorado em Design de Interiores. No nível de graduação, quando uma IES deseja implantar um curso de Design de Interiores é forçada a fazê-la no formato tecnológico. Dada a reduzida carga horária e a impossibilidade de aprofundar com qualidade a grande quantidade de conhecimentos, as práticas de ensino nesses cursos tecnológicos acabam focando os aspectos técnicos e menosprezando os aspectos teórico-práticos imprescindíveis. Com efeito, o desenvolvimento curricular sucumbe a uma matriz tecnicista – uma versão supostamente atualizada do ensino tecnicista já utilizado anteriormente no Brasil, mas que não atinge positivamente as necessidades urgentes da área: profissionais que pensem holisticamente sobre projetos e sua profissão.

2 Anos de abertura de fechamento da Escola Bauhaus.

2. Desenvolvimento

2.1. Fundamentação teórica

O número de cursos em Design de Interiores tende a crescer por todo o país e a área profissional, alavancada pela recente regulamentação, apresenta perspectivas de desenvolvimento para os próximos anos. Isso impõe a necessidade premente de discutir umas das principais mediações para a construção da identidade do designer de interiores, além daquelas relacionadas à organização e representação política enquanto categoria profissional: trata-se da mediação educacional realizada nos cursos de nível superior. Além da necessária formação acadêmica, no que concerne à graduação, o ensino profissional, por sua vez, não permite negligenciar as instâncias de pesquisa e produção de conhecimento, no âmbito da pós-graduação, tampouco dissociar-se delas, para que se possa discutir com propriedade os rumos do Design de Interiores e de suas práticas.

A formação dos profissionais de Design de Interiores, no Brasil, impõe a necessidade de desencadear uma reflexão sobre o implemento de políticas educacionais a serem protagonizadas de forma democrática por todos os concernidos nessa categoria profissional, com o escopo de articular as diferentes experiências de ensino e resgatar o conhecimento acumulado pelos cursos de Design de Interiores brasileiros, além das contribuições das principais instituições internacionais de representação, de ensino e de pesquisa nesta área. Existe um enorme acervo disperso e fragmentado sobre o tema e faz-se necessário reuni-los, tomando como critério articulador e unificador, o da construção da identidade profissional do designer de interiores e o significado de suas práticas. A troca de informações sobre as ações educacionais já desenvolvidas e em desenvolvimento estão se perdendo por falta de estudos e registros adequados e que precisam ser resgatados. Além disso, evidenciar as demandas e entraves dos Cursos para a construção da identidade profissional do designer de interiores como eixo estruturante dos respectivos currículos e requisito de sua excelência.

Eis o sentido de um necessário estudo comparado dos diversos projetos educacionais e respectivos currículos dos cursos de Design de Interiores. Deste modo, fica evidente que esta pesquisa acabou demonstrando a necessidade de um trabalho sério que servirá como orientação visando a necessária articulação e qualificação dos diferentes cursos espalhados pelo Brasil, em termos mínimos de excelência acadêmica. Excelência acadêmica que se estende para a excelência profissional, envolvendo-a.

2.2. Identidade profissional plena e representação social.

A construção da identidade profissional do designer de interiores – mediada principalmente pelos Cursos de Design de Interiores – exige compreendê-la como uma forma de representação social. Os estudos dos sociólogos Anthony Giddens e Claude Dubar permitem um aporte teórico significativo para compreensão do conceito de identidade profissional. Anthony Giddens compreende a identidade entrelaçando as características distintivas que envolvem auto compreensão de um indivíduo ou de um grupo. Tendo por referência seu conceito de reflexividade discute o conceito de auto identidade com base na compreensão de segurança ontológica dos indivíduos e suas experiências que, em termos fenomenológicos, têm a ver com o ser-no-mundo. Entende a possibilidade do sujeito tornar-se autor de seu projeto de vida e decidir sobre como adotá-lo sendo que esta decisão se realiza como fruto de sua liberdade de escolha e de seu poder como capacidade transformadora. Neste sentido, ele afirma que a auto realização torna-se fundamental para a auto identidade (GIDDENS, 1991; 2002; 2004).

Claude Dubar discute a ideia de socialização e a construção da identidade profissional. Entende que as atividades profissionais, produtoras de obras e de serviços, dão sentido à existência individual e organizam a vida de coletivos. Ressalta que elas “não se reduzem à troca econômica de um gasto de energia por um salário, mas possuem uma dimensão simbólica em termos de realização de si e de reconhecimento social”. Assim essas atividades “permitem àqueles que as exercem identificar-se por seu trabalho e serem assim reconhecidos”. Entende que essas identidades são construídas por e no processo específico de socialização, ligando educação, trabalho e carreira. (DUBAR, 2012).

Para que uma profissão seja realmente reconhecida e efetivada é preciso que sejam cumpridas algumas especificidades técnicas. O sociólogo Gordon Marshall indica, dentre outras características, a presença de uma instância reguladora para garantir o desempenho dos membros, de um código de conduta, gestão dos conhecimentos que sustentam as atividades profissionais e treinamento de novos profissionais (MARSHALL,1988). De acordo com Nicholas Abercrombie (1994), a identidade profissional pode ser definida como existente quando se denota o conjunto específico de características: uso de habilidades baseadas em conhecimentos teóricos; educação e treinamento nessas habilidades; competência dos profissionais assegurada por avaliações; código de conduta para garantir a integridade profissional; desempenho de um serviço que é para o bem público; uma associação profissional que organiza membros que compartilham dessa mesma identidade.

Christine Piotrowski (2002), com relação à formação e prática do designer de interiores, indica as características que esse profissional deve ter e/ou desenvolver para poder atuar profissionalmente garantindo a segurança, o bem-estar e a qualidade de vida dos usuários. Ter capacidade criativa a fim de tornar realidade as respostas às necessidades e problemas dos clientes: são vários os cenários – na interface indivíduo e espaço e sua relação existencial com os objetos – que permitem ao designer de interiores identificar e solucionar criativamente os problemas e as necessidades dos clientes.

Desde a Segunda Guerra Mundial, apesar das desigualdades e exclusões sociais, desencadeou-se um processo acelerado de desenvolvimento em várias dimensões, em níveis exponenciais, permitindo possibilidades quase ilimitadas na interface indivíduo-espaço e na sua relação com os objetos, determinantes para a compreensão do Design de Interiores. Essa situação impacta na ampliação de exigências e necessidades e, por sua vez, amplia as perspectivas profissionais de atuação e de auto compreensão do designer de interiores. A profissão vem evoluindo, ganhando novas nuances e demandas profissionais. As novas exigências – em virtude da complexidade e da interpenetração de várias áreas – implicam na evolução das formas de trabalhar.

Em concordância com as definições de Design de Interiores apresentadas pelas entidades internacionais representativas, constata-se que a atuação do designer de interiores vai muito além do mero objeto arquitetônico de modo que suas opções parecem quase ilimitadas exigindo dos profissionais de Design de Interiores a capacidade de valorizar as soluções de Design e de avaliar o impacto dessas soluções sobre a qualidade de vida das pessoas nos ambientes e espaços projetados. Antes do elemento estético devem ser considerados os processos de identificação de problemas e busca de soluções para os mesmos, as análises ergonômicas e antropométricas, dentre outros elementos fundamentais em qualquer projeto de Design.

A definição do National Council for Interior Design Qualification (NCIDQ, 2017) diz, resumidamente, que o designer de interiores profissional é qualificado através da educação, da experiência e do exame de aptidão para melhorar a funcionalidade e a qualidade dos espaços interiores. Com o objetivo de melhorar a qualidade de vida, aumentar a produtividade e proteger a saúde, segurança e bem-estar do público.

Não há registros oficiais sobre as primeiras escolas com cursos livres de Decoração porém, em 1959 surgem as duas primeiras escolas de nível superior da área: Instituto de Arte e Design (IAD) em São Paulo e outro na UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro. A área foi oficializada como profissão apenas em 1990 através de sua inserção na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) do Ministério do Trabalho.

A maioria dos designers de interiores brasileiros ignoram o quanto ainda falta saber e conhecer sobre a história de sua própria profissão e, por conseguinte, o quanto isto entrava a plena e correta concepção e definição dos espaços, dos detalhes e das especificações (materiais, produtos e processos) em cada tipo de projeto e, sobretudo, entrava a construção de sua identidade profissional.

Com base em Bryan Lawson (2011), que busca distinguir e esclarecer para que servem as diferentes atividades projetuais desenvolvidas em vários campos, importa delinear o perfil profissional do designer de interiores para pensar sua formação acadêmica nos Cursos de Design de Interiores, cuja importância é enfatizada por Christine Piotrowski (2002), por entender que o futuro profissional deve ser qualificado, mediante apropriação ativa e significativa de saberes e competências, para exercer as várias funções e atividades relacionadas com as disciplinas do currículo. Ao destacar a importância da formação acadêmica específica para o exercício profissional, percebe-se que esta especificidade consiste em uma premissa de todas as associações e entidades representativas da profissão ao redor do mundo a fim de evitar erros projetuais que possam vir a colocar os usuários e a sociedade em risco.

3 Na maioria dos países, a prática profissional depende da aprovação nos exames de aptidão. Somente os aprovados têm o direito de exercer a profissão legalmente. Estes exames buscam identificar se o pretendente possui realmente todas as qualificações e conhecimentos necessários para o correto exercício profissional garantindo a segurança dos usuários envolvidos nos projetos.

4 O Design de Interiores não atua exclusivamente no objeto arquitetônico. Existem outros objetos base que podem ser trabalhados por estes profissionais também como: aeronaves, embarcações, trens, ensino e pesquisa e diversos outros objetos que não tem ligação com a Arquitetura. Isso, de certa forma, serve também para cortar o cordão umbilical imposto entre Arquitetura e Design de Interiores e Ambientes.

No entanto, no ato da sanção presidencial à Lei n° 13.369/2016, o Presidente da República Michel Temer, para atender os interesses corporativistas de grupos que, durante anos, atentaram contra a regulamentação do Design de Interiores, vetou os artigos 3° e 7°, que tratavam da exigência de formação acadêmica para o exercício profissional, sendo o primeiro sobre o ensino superior e o segundo sobre a formação técnica.

Paula da Cruz Landim (2010), ao tratar do ensino do Design no Brasil, apresenta um panorama da situação acadêmica brasileira na área do Design. Em linhas gerais ela demonstra que o modelo educacional adotado reduz-se ao formato tecnicista. O incentivo à pesquisa neste modelo é quase nulo uma vez que os cursos são direcionados a formar projetistas, o que culmina numa baixíssima produção de conhecimento específico sobre a área. Tudo isso tem a ver com as alterações promovidas pela Lei nº 9.131/1995, Diretrizes e Bases da Educação, que deixou em aberto para o Conselho Nacional de Educação Superior a atribuição de definir e normatizar os cursos de nível superior brasileiros. Através de resoluções e pareceres, este Conselho foi permitindo brechas para que as instituições de ensino tivessem autonomia para moldar os cursos “de acordo com as demandas de mercado” e não para atender as necessidades da sociedade que envolvem essa área profissional. Uma sucessão de novos pareceres e resoluções foram editados e postos em vigência. Dentre estes está a possibilidade de abertura de cursos de curta duração visando a formação de mão de obra qualificada em um período mais curto para atender uma suposta “demanda de mercado”. Demandas de mercado foi colocado propositalmente entre aspas pois é claro que tais normativas buscam beneficiar apenas – e tão somente – as IES privadas. As mesmas que vêm transformando a Educação em uma mera mercadoria e buscando, sempre que possível, manter cursos com o menor custo possível dando pouca importância à qualidade dos mesmos. Curiosamente, os cursos considerados como principais ou “de elite” – também, os mesmos que são mais caros – são mantidos e recebem investimentos constantes em sua manutenção e ampliação.

Para atender as necessidades da sociedade, no âmbito do Design de Interiores, faz-se necessária a implantação de cursos mais consistentes onde a pesquisa e a produção de conhecimento sejam valorizadas continuamente fazendo-se presente de forma clara em seus projetos político-pedagógicos e, principalmente, nos conteúdo das disciplinas. Do mesmo modo que os fundamentos epistemológicos, estéticos e éticos sejam debatidos considerando os alunos sujeitos de seu próprio desenvolvimento. Note-se que isso vai muito além da exposição de maquetes ou apresentação de projetos plotados, comuns nos cursos atuais. Segundo Landin (2010), os alunos devem ser conduzidos “a abstrair-se momentaneamente do produto que vem a ser o escopo de seu projeto. Ele tem de aproximar-se do contexto e da situação que envolvem o tema projetual proposto”.

Um dado preocupante remete aos resultados do último ENADE realizado em 2015 (INEP, 2016) que confirmam os déficits dos Cursos de Design de Interiores, no Brasil: quase 60% dos cursos tecnológicos ficaram com conceito 3 ou menor e, dos 82 cursos participantes, apenas três receberam nota 5: conceito 1: 3,7%; conceito 2: 19,5%; conceito 3: 35,4%; conceito 4: 28%; conceito 5: 3,7%. Com isso quem perde é a sociedade como um todo, não apenas o mercado e, principalmente, a própria profissão que vê seu conceito educacional muito abaixo do desejável – considerando-se a qualidade formativa visando o exercício profissional. O fortalecimento da identidade profissional do Design de Interiores e a autonomia necessária para a construção interdisciplinar de suas bases epistemológicas não se podem realizar sem encarar a problemática da formação profissional. Nesse sentido, é papel fundamental da academia de Design de Interiores questionar o atraso vigente e propor novos horizontes e possibilidades para as Diretrizes Curriculares da área junto ao MEC.

5 Veto Presidencial n° 49/2016.

O fortalecimento da identidade profissional do Design de Interiores e a autonomia necessária para a construção interdisciplinar de suas bases epistemológicas não se pode realizar sem encarar a problemática da formação profissional. Aqui reside a intencionalidade estruturante deste problema e sua inequívoca relevância teórico-prática

3. Conclusão

Isso tudo aponta para a importância de analisar e comparar de forma urgente as diferentes experiências formativas dos Cursos de Design de Interiores, no âmbito nacional e internacional. A evolução do Design de Interiores atinge a realidade brasileira e demandam cursos específicos que, por sua excelência formativa, sejam voltados para a construção da identidade profissional dos designers de interiores e, por sua vez, para os novos desafios de suas práticas na sociedade. Não há como dissociar esses dois aspectos, considerando a mediação teórico-prática no desenvolvimento curricular desses Cursos.

Exposta a problemática referente à ausência de uma real e autônoma identidade profissional para os designers de interiores e identificados os elementos necessários para a construção desta de forma coerente com a realidade internacional – o que trará segurança jurídica e reconhecimento social da profissão – percebe-se que todos os problemas levantados nesta pesquisa apontam para a formação acadêmica que, através de falhas estruturais e conceituais – inclusive junto às Diretrizes Curriculares do MEC – que vêm sendo mantidas, tendo sido traçadas e elaboradas recheadas de equívocos – a maioria intencionais por interesses de forças externas à profissão – que não permitem à profissão em pauta ter um olhar sobre si mesma efetivamente positivo e realista, em consonância com a realidade internacional. Nesse sentido, faz-se necessário remeter à crítica os aspectos negligenciados e apontar os equívocos que induzem à descaracterização na abordagem do Design de Interiores e seus reflexos na formação e no exercício profissional no Brasil.

Percebe-se portanto, a necessidade de ressaltar os pressupostos teórico-práticos do Design, as finalidades educacionais relativas à formação dos futuros designers de interiores, identificar similaridades e diferenças curriculares que permitem a construção da identidade profissional e suas práticas, tendo em vista a demonstração dos entraves e das possibilidades no que concerne à reivindicação do livre exercício profissional, com autonomia e plenitude, suas perspectivas na configuração dos cursos superiores de Design de Interiores e consequente apropriação de saberes, competências, habilidades, e atribuições para o pleno exercício profissional no Brasil. E isso somente será possível após submeter à crítica as matrizes curriculares de determinados cursos superiores de Design de Interiores ofertados no âmbito nacional e internacional.

Há que se fazer uma análise das bases legais e da curricular comparativa entre os cursos brasileiros e os ofertados no exterior que servirão de base, identificar as similaridades e as disparidades curriculares em relação ao pleno exercício e a construção de uma identidade profissional. Através de pesquisa bibliográfica e documental, trazer elementos que permitam fundamentar a análise da estrutura curricular dos cursos de Design de Interiores, suas bases e direcionamentos curriculares, suas origens e forças que as moldam, comparando-as. Também, realizar entrevistas com docentes pesquisadores, historiadores e associações profissionais envolvidos da formatação dos cursos brasileiros a fim de detectar como procedeu – ou procede – a negociação relativa às atribuições profissionais (do designer de interiores) que tangenciam outras áreas correlatas e como isso foi solucionado – ou não. Por fim, trazer apontamentos para uma urgente revisão e atualização das diretrizes e matrizes curriculares para o ensino de Design de Interiores brasileiro.

Enquanto não é superada a etapa relativa à formação acadêmica, deve-se buscar então uma ampla campanha de valorização e visibilidade destes profissionais na mídia encarando de frente os obstáculos e mostrando o que é, quem são e para que servem os profissionais de Design de Interiores. Através destas ações interligadas será possível superar e recuperar os tempo perdido e os danos causados à imagem profissional junto à sociedade. Nesse sentido, a ABD vem trabalhando, especialmente desde a gestão da senhora Renata Amaral, de forma enfática em diversas ações:

• Na academia, implantou o programa ABD Escola onde estão vários projetos que, além da aproximação com as escolas através de apoio técnico-pedagógico e palestras gratuitas, promove ações como: a instituição de um Conselho Acadêmico composto por sete docentes qualificados (mestres e doutores); o Prêmio Láurea Máxima Brasil Design de Interiores (premiação para os melhores TCCs ou TFGs); Anuário Acadêmico (Revista científica IntraMuros voltada para a publicação de artigos científicos específicos sobre DInt e com conselho editorial próprio – a primeira no segmento aqui no Brasil); o Portal Acadêmico (espaço voltado para docentes cadastrados onde são debatidos os problemas aqui relatados e outros mais relativos à profissão e academia).

• Junto aos órgãos públicos: revisão da CBO por níveis de formação acadêmica; revisão e atualização das matrizes curriculares e ruptura da proibição de abertura de cursos de bacharelado junto ao MEC; incentivo e fomento à pesquisa junto ao CNPq; formação, junto ao INEP, de uma equipe habilitada em Design de Interiores para as ações relacionadas ao ENADE; participação nos comitês relativos à área na ABNT; aproximação e parcerias com Conselhos Federais; estruturação e implementação de atividades junto ao SEBRAE; parcerias com órgãos diversos como, por exemplo, o SINDUSCON entre outras diversas atividades em desenvolvimento atualmente.

• Também está implantanda, agora em 2018, uma forte campanha de visibilidade e valorização profissional onde o meio acadêmico finalmente tem voz nas decisões sobre a mesma. Tal campanha visa esclarecer corretamente a sociedade sobre o DInt ao mesmo tempo em que desconstrói os “achismos” e mostra o potencial da área e os benefícios que ela traz para as pessoas, o desenvolvimento empresarial, social e econômico do país.

Mais importante que todas estas ações elencadas acima está a necessidade urgente do Conselho Acadêmico alcançar a sua autonomia plena seja esta relacionada às ações bem como a financeira. A primeira diz respeito a conteúdos gerais envolvendo as ações que a ABD venha a tomar. Nada deve ser feito sem o aval deste conselho que deve, acima de tudo, primar pela excelência acadêmica que direcionará todas as ações políticas e mercadológicas da associação. Também, a autonomia para definir o que deve ser feito junto à academia e órgãos responsáveis visando promover a melhoria na qualidade e a valorização dos cursos. Já no segundo aspecto, o corpo acadêmico deve ter seu trabalho e planejamentos resguardados pela garantia financeiras para a execução de seus planos e atividades, de forma autônoma sem a necessidade de aval de outras partes que não percebem a importância da academia nesse processo de construção da verdadeira identidade profissional. Afinal, como ficou claro neste artigo, é na academia que esta é construída.

Fica evidente que os primeiros passos estão sendo dados porém, ainda são insuficientes afinal, os principais problemas desta profissão encontram-se nos pontos destacados nesta pesquisa. Portanto, faz-se necessário esmiuçar estes elementos analisando-os, comparando-os, buscando identificar os erros que prejudicam a plena formação e exercício profissional (problemas) e propor alternativas e modelos para superá-los (solução). Os primeiros passos estão sendo dados porém, ainda tem muito trabalho a ser feito afinal, Design não é custo. É investimento!

Referências

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DUBAR, Claude. A construção de si pela atividade de trabalho: a socialização profissional. Cad. Pesquisa, São Paulo, v. 42, n. 146, p. 351-367, Agosto. 2012. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742012000200003&lng=en&nrm=iso

FORTY, Adrian. Objetos de Desejo. Edição revisada e ampliada. Ed. Cosac Naify, 2013.

GROPIUS, Walter. Bauhaus: Novarquitetura. 2 ed. São Paulo, Perspectiva. 2004.

GIBBS, Jenny. Interior Design. Londres, Laurence King Publishing, 2009.

GIDDENS, A. Sociologia. 6ª.ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008.

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INEP. ENADE 2015 – Relatório Síntese da área: tecnologia em Design de Interiores. Brasília, INEP. 2016.

LANDIM, P. C. Design, empresa, sociedade [online]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. 191 p. ISBN 978-85-7983-093-8. Available from SciELO Books.

LAWSON, B. Como arquitetos e designers pensam. São Paulo, Oficina de Textos, 2011.

MARSHALL, G. A Dictionary of Sociology, 2nd ed. New York: Oxford University Press. 1998.

PIOTROWSKI, Christine M. Professional Practice for Interior Designers. 3 Edition. New York: Published by John Wiley & Sons, Inc. 2002.

SUDJIC, Deyan. The Language os Things. Reino Unido, Penguin Books Ltd, 2008.

WOLF, Tom. Da Bauhaus ao nosso caos. Rio de Janeiro, Ed. Rocco. 1990.

Currículo do autor

Paulo Roberto Gonçalves de Oliveira
Paulo Oliveira, graduado em Design de Interiores com especializações em Educação e em Lighting Design. Autor do blog “Design: Ações e Críticas”, fundador e mantenedor do Portal DesignBR, palestrante em eventos importantes como NDesign – entre outros, docente de graduação e pós-graduação. Atualmente é Coordenador Acadêmico da ABD-PR.

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