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Dodis – Egressos de cursos de Design de Interiores abrindo novos caminhos: o design social

EGRESSOS DE CURSOS DE DESIGN DE INTERIORES ABRINDO NOVOS CAMINHOS: O DESIGN SOCIAL

Autor

Cláudia Estefânia Ferrari

Ao contrário do que temos como estereótipo, design de interiores não é puramente estético e voltado para classes abastadas. Se olharmos com afinco e compromisso o que o design se propõe enquanto disciplina, entenderemos que design é para todos e indissociavelmente funcional. Nossa profissão é solutiva e temos muito o que estudar e fazer para aqueles que vivem os maiores desafios no momento de habitar. Não sendo novidade, essas pessoas são pertencentes às camadas menos privilegiadas da nossa sociedade.

Assumindo o compromisso social da nossa profissão, hoje construímos um projeto de design social na Secretaria Municipal de Habitação e Regularização Fundiária de Niterói — RJ. No primeiro semestre deste ano, a designer de interiores que vos fala foi contratada para integrar a equipe técnica e multidisciplinar da secretaria. Este momento e tal contratação foram possíveis pelo entendimento sobre design do então subsecretario José Carlos Freire e o trabalho que este faz em conjunto com Ana Eliza Roder França, Marta Mendes e Nora Geoffroy, pela oportunidade dada pelo secretário de habitação Beto da Pipa e pelo trabalho da ABD na regularização da profissão. O desafio é criar um projeto que leve design de interiores para os programas de habitação de interesse social. 

Em maio deste ano nasce o projeto “Da Porta para Dentro: planejando o lar com design de interiores”, que consiste em oficinas e consultorias individuais de design de interiores visando promover o aumento da qualidade de vida, autoestima e sentimento de pertencimento do morador com o lar. O projeto vai além da entrega das moradias, ampliando a atuação dos programas de habitação de interesse social do Município de Niterói. Atualmente, atendemos os beneficiários dos programas Compra Assistida e Minha Casa Minha Vida (então denominado Casa Verde e Amarela). O recorte socioeconômico das famílias beneficiárias é de renda mensal de até dois mil reais, estruturas familiares diversas e com uma série de carências sociais. O projeto é desenvolvido em conjunto com assistentes sociais, que dão suporte para acessar e aprender sobre a realidade das famílias atendidas e auxiliam nas abordagens e metodologias. Para nossa atuação, estamos construímos uma rede que, hoje, conta com o apoio técnico da Associação Brasileira de Designers de Interiores (ABD), com o trabalho voluntário dos alunos de design de interiores das universidades UFRJ e UVA e com a assistência das secretarias municipais da Mulher (CODIM e CEAM), do Idoso e de Acessibilidade. 

Um dos requisitos para implementar um projeto de política pública é promover a autonomia dos beneficiários, para isso, metodologias estão sendo elaboradas e testadas com o objetivo de gerar reflexão sobre os espaços habitados a partir da promoção de conhecimentos técnicos do design. A fim de que o morador possa desenvolver olhar crítico aos problemas que se apresentam e buscar saídas. Na verdade, essa busca já existe por parte da população que atendemos. A proposta é que as soluções criadas por eles sejam alinhadas com segurança e bem-estar, aspectos promovidos pelo design. 

A necessidade de desenhar uma metodologia de atuação que não coloque em risco a escuta ativa das famílias em prol da redução de custos é vital para alcançarmos o objetivo final de melhoria na qualidade de vida nas habitações. A escuta do beneficiado é indispensável para compreender as necessidades individuais e as possibilidades de execução, só assim o designer pode estudar saídas de baixo custo e custo zero, criando soluções práticas, personalizadas e acessíveis, considerando materiais, objetos e móveis que as famílias possuem e suas capacidades de execução. 

O projeto precisa ser replicável, para isso, a metodologia deve ser de fácil compreensão e aplicação. Mas é preciso lembrar que estamos em um mercado não desbravado por nossa profissão. Existe um desconhecimento sobre como solucionar os problemas que as tipologias de moradias de interesse social apresentam. Ao entrarmos nas casas, nós temos a oportunidade de entender o que funciona e o que falta. Portanto, dois pontos se desdobram a partir do requisito de aplicabilidade do projeto. Primeiro, é preciso identificar os problemas e as possíveis soluções para os espaços para, então, munir os designers de interiores com informações que os capacitem a atender a população beneficiária do projeto. Não temos como criar soluções mágicas e nem seria admissível ao designer de interiores replicar soluções de imediato. Mas ainda se faz necessário identificar padrões e possíveis saídas para orientação dos designers.

No caso dos condomínios do antigo Minha Casa Minha Vida, as plantas dos apartamentos seguem o padrão de dois quartos, sala, cozinha integrada com área de serviço e banheiro em cerca de 40 m². Porém, as composições familiares não são padronizadas. Temos desde pessoas morando sozinhas como famílias compostas de oito pessoas, mais seus animais de estimação. Para entender o processo de adaptação é preciso conhecer a tipologia de habitação que as famílias beneficiadas moravam anteriormente. Em sua maioria, habitavam casas informais construídas conforme suas necessidades. Nos condomínios elas se veem na situação oposta, precisam se adaptar aos limites impostos pelas paredes dos apartamentos e alguns problemas enfrentados se repetem.

Principalmente nas famílias maiores, a falta de espaço leva a uma mistura das atividades e sobreposição de funções nos ambientes, ocasionando desordem e dificuldades na execução das tarefas. A setorização dos ambientes então se dilui. 

À medida que o número de pessoas na casa aumenta, o compartilhamento dos espaços e a garantia de privacidade se tornam mais difíceis. A falta de delimitação de espaços íntimos dificulta o processo formação das individualidades. É imprescindível que plantas de cunho social tenham seus espaços sociais privados e de serviço, bem delimitados. Seria maravilhoso se pudessem ser personalizadas, porém, pequenos ajustes nas plantas já facilitariam uma melhor implantação de layout para cada família.

O acúmulo de objetos e os móveis superdimensionados dificultam a organização dos espaços internos, pois extrapolam a capacidade do espaço. A falta de orientação e as tipologias de móveis acessíveis a esse público não condizem com a tipologia dos apartamentos, nem atendem as demandas de flexibilidade e multifuncionalidade. Assim, o processo de adaptação da família à nova moradia se torna mais difícil gerando insatisfação e até o abandono da casa ou locação da unidade, sendo uma prática proibida. Isso tudo reforça a necessidade do trabalho do designer de interiores para a habitação de interesse social. 

Ao entrar nas casas não vemos apenas as questões espaciais, mas uma série de carências sociais e privações que essas famílias vivem. Muitas vezes, o sentimento de incapacidade diante da realidade nos para, mas é preciso lembrar que o espaço é um reflexo dos seus ocupantes e provocador de estímulos, sendo assim, protagonista de mudanças nas vidas de seus habitantes. Esta certeza nos recoloca em movimento.

É animador ver dentro das próprias casas o horizonte para uma atuação eficaz. Precisamos repensar nossas soluções e aprender com as famílias que atendemos. Elas são extremamente criativas e produtoras de soluções. As gambiarras, vistas de forma pejorativa, são, na verdade, as saídas encontradas por elas devido à privação de recursos e nos ensinam a dar novas funções aos objetos que vêm com finalidades pré-determinadas pela indústria. Cabe ao designer treinar seu olhar de modo a incorporar essas soluções e desenvolvê-las para serem mais seguras e eficientes. Essa troca cultural com as famílias nos ensina sobre a estética, os símbolos e os afetos. É preciso, não só respeitá-los, mas destacá-los. Eles são meios para estimular a conexão do morador com o lar. Não podemos nos limitar às referências costumeiras e externas, precisamos olhar para dentro das casas para vê-las. Essa é a essência do design e, assim, é possível construir o design social. 

Precisamos imergir no cenário real da habitação de interesse social para voltar ao design e a toda sua cadeia produtiva, reavaliando a profissão desde a academia até a sua atuação no mercado, a fim de atender esse recorte da população. É importante trabalhar na pós-ocupação como estamos fazendo atualmente, mas também na origem dos problemas apontados. O design de interiores precisa estar integrado em todo ciclo, desde a elaboração de projeto até a mudança do beneficiário. O design social está comprometido com o propósito do design em buscar soluções para melhoria da vida das pessoas e é promotor de mudanças sociais. Só com a inserção do design em um projeto social bem estruturado é que poderemos dar à política habitacional a sensibilidade fundamental de olhar para o indivíduo. 

Mini Biografia

Cláudia Estefânia Ferrari, bacharel em Composição de Interior pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), designer de interiores na Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária do Município de Niterói (SMHRF).

 

 

 

 

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