Com o objetivo de acrescentar a biofilia como elemento integrante no design de Interiores, valorizando os materiais naturais, proporcionando sensações positivas aos indivíduos em um determinado espaço, ao mesmo tempo que se funde aos conceitos sustentáveis, o presente artigo utilizou-se de metodologia qualitativa, com abordagem exploratória, partindo de revisão bibliográfica. Para tanto, fez-se necessário traçar o histórico do design de Interiores e sua relação com a natureza. Por conseguinte, a busca pela origem da biofilia e como aplicá-la nos novos projetos, explanando estratégias para utilização do design biofílico. Observou-se a necessidade crescente da reinserção da natureza nos ambientes edificados, sendo este apenas o início de uma era biofílica, que pode agregar, ainda, o design universal, ecodesign, neurodesign, além do amplo viés da sustentabilidade. Esse estudo é o início de um longo ciclo acerca do assunto.
Palavras chaves: biofilia; design biofílico; design de Interiores.
Aiming to add biophilia as an integral element in interior design, valuing natural materials, providing positive sensations to individuals in a given space, while merging with sustainable concepts, this article used a qualitative methodology , with an exploratory approach, starting from a literature review. Therefore, it was necessary to trace the history of interior design and its relationship with nature. Therefore, the search for the origin of biophilia and how to apply it in new projects, explaining strategies for using biophilic design. There was a growing need for the reinsertion of nature in built environments, which is just the beginning of a biophilic era, which can also add universal design, ecodesign, neurodesign, in addition to the broad bias of sustainability. This study is the beginning of a long cycle on the subject.
Keywords: biophilia; biophilic design; interior design.
A casa faz referência à construção física (tijolos e cimento), enquanto o lar é permeado de valores e princípios, onde os indivíduos apropriam-se do espaço, buscando aconchego. A soma de concepções de um indivíduo traduz-se em símbolos e representações, lembrando que a cultura é instável, podendo ser alterada por inferência de um outro grupo, ou mesmo devido à crescente globalização, trazendo mudanças de pensamento em um núcleo social com o passar do tempo.
A identidade e o multiculturalismo estão atrelados à memória afetiva e lembranças, desencadeando sensações e percepções de um indivíduo. O design de Interiores, ao trabalhar com o briefing do cliente, busca traduzir seus costumes e gostos em forma de objetos e móveis, ou seja, produz os significados de uma vida em um dado ambiente. Sinteticamente, o nível de satisfação de um indivíduo dentro de um espaço caracteriza o conforto ambiental. Dessa forma, um espaço com qualidades ergonômicas, boas condições acústicas, térmicas e visuais, permitindo realizar atividades habituais, de lazer ou trabalho, pode ser sentido e percebido por quem o usa.
Ora, estando o conforto ambiental atrelado à percepção de quem se apodera do espaço, importa sobrevir acerca da sinestesia, pois o sistema sensorial determina o conforto ambiental em um espaço. Por conseguinte, a adequação de um ambiente envolve as condições físicas do espaço, junto às condições psicológicas de um indivíduo, o que torna o espaço percebido de formas diferentes por cada pessoa.
Posto isto, um novo termo surge para somar às discussões propostas, a biofilia, tida como “amor à vida.” Ou seja, a influência da natureza no conforto ambiental e sensações percebidas pelo indivíduo. O design biofílico, portanto, vem a somar com os conceitos supracitados, interferindo diretamente nas sensações e percepções obtidas em um ambiente. A arquitetura preocupa-se em planejar e projetar os espaços urbanos, frente à soma de elementos técnicos, históricos e culturais, enquanto o design de Interiores participa diretamente desse processo, buscando a melhoria da qualidade de vida das pessoas. A decoração faz parte dessa apropriação espacial, pois, com a composição interna, é possível conferir sentidos a um lugar, tornando-o mais significativo.
A arquitetura e o design de Interiores, juntos, constroem o habitat. Forma, espaço, luz e sombra influenciam nas relações interpessoais, atraindo ou repelindo pessoas, fazendo referência à atmosfera que se cria no interior, objetivando o conforto. Em se tratando do fatídico período pandêmico o qual o mundo está atravessando, faz-se necessário ressignificar a vida e o morar.
O presente artigo visa destacar a relação entre a biofilia e o design de Interiores, agregando o novo termo como elemento complementar para se alcançar a satisfação do indivíduo em um espaço a ser projetado. A pesquisa é de abordagem qualitativa e exploratória, buscando familiaridade com a situação, abordando a amplitude do design biofílico, partindo-se de revisão bibliográfica.
Para tanto, o trabalho está estruturado em quatro tópicos, sendo a Introdução para delinear o processo da pesquisa; o segundo tópico para se compreender a história do design e sua relação com a natureza; o terceiro, por sua vez, trará reflexões do termo biofilia; o quarto unirá o design à biofilia, ou seja, a aplicação do design biofílico nos ambientes residenciais e comerciais; além das Considerações Finais.
O desenho faz parte do design que, por sua vez, está relacionado a artes, sendo um processo criativo que utiliza espaço, forma, linhas, texturas, luz e cor (GURGEL, 2011). Pode-se mencionar que o design é um projeto que utiliza a criatividade aliada ao melhor aproveitamento de tempo e material.
Löbach (2001) destaca que a estética não se trata da beleza de determinado objeto ou móvel, o que importa é a soma de formas, cores e texturas, que, de forma harmoniosa, possa sensibilizar o usuário. Para tanto, o uso sensorial depende, além da percepção do usuário, de experiências anteriores. A função simbólica, por sua vez, carrega um significado, estando intimamente ligada à percepção visual do indivíduo.
A vida da maioria das pessoas não é mais imaginável sem o design, que é visto na casa, no trabalho, no lazer, no transporte, na saúde, em qualquer horário do dia ou da noite, em qualquer tempo (BÜRDEK, 2010). O design é, portanto, imprescindível na tradução de uma ideia, sendo influenciado por disciplinas como a antropometria e ecologia, ao passo que produz beleza e funcionalidade.
Em se tratando do design de Interiores, relaciona-se à melhor forma de aproveitamento do espaço, em que o conjunto de ideias e soluções para otimizar o espaço a ser projetado busca conforto, ergonomia, práticas sustentáveis, objetos e móveis multiuso. Ou seja, o projeto bem pensado e executado de acordo com as necessidades pendentes, visa praticidade e criatividade, integrando conforto, elegância e funcionalidade.
Gurgel (2013) considera que o primeiro passo para um bom design é a capacidade de alterar paradigmas, conceitos e preconceitos, mantendo a mente aberta para soluções desconhecidas e inovadoras. Os componentes culturais devem e podem influenciar o design, sendo responsáveis pela identidade do projeto. Se cada povo tem sua forma de pensar, agir e viver, limitando sua cultura, essas características são, portanto, fundamentais no processo criativo do design de Interiores
De acordo com Brown e Farrelly (2014), a Revolução Industrial trouxe diversas mudanças para os ambientes residenciais, transformando os métodos de produção e o uso de materiais no desenho dos móveis e objetos de decoração. Com os transportes aprimorados, as indústrias tinham acesso a abundantes fontes de matéria-prima, o que impactou na produção de ferro e aço e o avanço da indústria têxtil.
Foi nesse período que o padrão de vida aumentou e o consumidor de classe média passou a investir na decoração interna de sua moradia, seguindo as tendências da moda e imitando o estilo das classes sociais superiores. A Revolução Industrial, portanto, substituiu o trabalho manual pela produção em série de artefatos de cerâmica, móveis, carpetes e outros objetos domésticos. Com isso, a produção de papéis de parede e tecidos para cortinas e estofamentos, antes impressos à mão com o uso de blocos e feitos com pigmentos naturais extraídos de insetos, plantas e flores, transformou-se, graças à mecanização e ao uso de tinturas baratas à base de anilina. Essas mudanças permitiram uma abundante produção de papéis de parede e tecidos com diversas cores e estampas (BROWN; FARRELY, 2014).
Azevedo (1988) elucida alguns movimentos determinantes na história do design, como o Art Nouveau, em 1883, em que ressaltava o trabalho individual do artista, tendo foco em ilustrações, objetos de vidro, madeira trabalhada e ferro ornamentado. Antoni Gaudí, importante arquiteto gótico, teve grande destaque nesse movimento, que exaltava as formas orgânicas da natureza. Outrossim, a Vanguarda Soviética, um dos mais importantes movimentos dentro da Arte de Vanguarda, que primava pela reformulação da estética do design, pautada nas áreas de arquitetura, escultura, poesia e até diagramação de textos e, apesar das diversas nomenclaturas, “a ideia central era uma só: tornar a arte popular uma arte de estilos da qual o povo era o maior beneficiado” (AZEVEDO, 1988, p. 26).
No final do século XIX, na Alemanha, com a fusão da escola de artes plásticas, de Walter Gropius, e a escola de artes aplicadas, de Henry van de Veld, surge a Bauhaus, sendo de suma importância para a arte e cultura internacional (RIBEIRO; LOURENÇO, 2012). A ideia fundamental de Groupius era unir arte e técnica, sendo a Bauhaus essencial para o ensino do design, visto que a escola formalizou o ensino das artes e ofícios com uma formação prática, propôs reflexões acerca dos materiais e sua composição, bem como instigou a utilização de cores e formas simplificadas, como explicam estes autores. Este panorama histórico é facilmente compreendido na figura 1.
Figura 1 – História do Design: principais marcos. Fonte: BROWN; FARRELLY, 2014. TAGLIARI; GALLO, 2007. BÜRDEK, 2010.
AZEVEDO, 1988. RIBEIRO; LOURENÇO, 2012. PLATCHECK, 2012. Adaptação: Ana Carla F. S. Porto/ 2018.
Com base na linha do tempo, é notável as mudanças social, econômica e ambiental geradas pela industrialização. Um processo que trouxe avanços significativos de uma forma geral e impactou, sobretudo, no design, na construção, nos ambientes internos de moradia e trabalho e na forma de consumo desenfreado. Por outro lado, afastou o ser humano do meio natural.
De acordo com De Sá e Viana (2020), a natureza dispôs de bilhões de anos para aperfeiçoar seus sistemas visando a eficiência e sobrevivência, em que uma pluralidade de organismos, incluindo seres microscópicos, macroscópicos, vegetais e animais, possuem configurações e estratégias instaladas evolutivamente, as quais podem revelar soluções para desafios persistentes. Percebe-se, então, a espécie humana repensando sua relação com a natureza, tornando-a um grande repositório de conhecimento e inspiração para profissionais de design. Assim, a natureza constitui uma diretriz relevante em projetos de design e os aportes da biomimética merecem ser mais pesquisados no intuito de produzir conhecimentos teóricos e práticos na área, sendo que, no design de Interiores, as perspectivas são voltadas para a preservação ambiental e o desenvolvimento de projetos e produtos sustentáveis.
A natureza é portadora de significados, expressando valores e crenças, ou seja, possui uma dimensão simbólica. O estudo da paisagem, a técnica de planejá-la, é o que se chama de paisagismo, sendo uma expressão artística em que participam os cinco sentidos do ser humano, proporcionando uma rica vivência sensorial (ABBUD, 2010). Como já citado, as sensações são individuais, desencadeadas a partir da cultura, identidade e memória do indivíduo. Portanto, a percepção varia de pessoa para pessoa.
O paisagismo é visto como um grande elo na realização do projeto de design de Interiores, agregando beleza, praticidade, funcionalidade e ergonomia. Portanto, qualifica e estrutura espaços internos e externos, considerando os contextos social, cultural, econômico e ambiental, as dimensões funcionais e simbólicas e necessidades dos usuários. O paisagismo harmoniza a interação do ser humano com o meio ambiente, proporcionando melhor convivência com a natureza, se fazendo presente em todos os recantos habitados pelo Homem (ABBUD, 2010).
O termo biofilia foi popularizado por Eduard Wilson, em 1984. Tem por significado o “amor à vida”, à natureza, ao natural, ou seja, a relação do ser humano com os demais organismos vivos. A necessidade da conexão com a natureza refazendo esse elo perdido, é motivada pelas muitas mudanças ocorridas na sociedade, devido à evolução humana (LADISLAU, 2019).
Entende-se por biofilia o conjunto de sensações positivas que a vegetação e os elementos naturais despertam no ser humano. Estas sensações são percebidas quando em contato com elementos naturais que favoreciam a sobrevivência na pré-história e que estavam associados às necessidades básicas do homem, tais como, comida, água e segurança (ULRICH, 1984).
A busca pelo contato com elementos naturais é crescente, junto a adoção de um estilo de vida desacelerado, em que os indivíduos buscam por hábitos saudáveis e a conservação dos recursos naturais. O desafio do design biofílico, portanto, é estabelecer uma nova possibilidade para a experiência satisfatória da natureza em locais construídos.
Esse conjunto de sensações positivas que os elementos naturais propiciam ao ser humano também podem ser vistas em um estudo realizado no Reino Unido, em que, comparando dois grupos de funcionários expostos a diferentes tipos de contato com a natureza, puderam observar um aumento de 15% na produtividade ao longo de um período de três meses para aqueles que trabalhavam em escritórios com vegetação natural, em contrapartida aos que trabalhavam sem contato com o verde ou outros elementos naturais (BROWNING e COOPER, 2015).
Impera ressaltar a semelhança das características oriundas da biomimética, não sendo simplesmente uma ciência que copia os elementos oriundos da natureza. Arruda (2015) afirma que a biomimética é a solução necessária para problemas reais, propondo reflexões sobre mudanças, trazendo respostas para necessidades específicas, gerando novas perspectivas que permitam ter uma percepção visual de objetos com um viés mais sustentável e implantar na sociedade uma responsabilidade com relação ao futuro do meio ambiente.
Trata-se da aplicabilidade desses elementos e conceitos em diversos campos através de uma análise completa e pormenorizada dos atributos desenvolvidos pelos seres vivos que, ao longo do processo evolutivo, demonstraram maior desempenho em relação à seleção natural, corroborando, assim, sua superioridade através da composição física e estrutural (ARRUDA, 2015).
Vale lembrar que em 1883, no movimento Art Nouveau, já se falava da reintegração do homem com a natureza. Segundo Azevedo (1988, p. 22), este movimento surgiu “da necessidade de exaltar a natureza e principalmente falar da vida bucólica que começava a desaparecer com a rápida industrialização da Europa.” Percebe-se, então, como é antiga a influência da natureza no design. Artista de notoriedade do movimento Art Nouveau, Gaudí desenvolveu um estilo singular em que se mesclavam elementos biomórficos e composições fantasiosas.
Sá (2018, p. 27) evidencia que a abordagem atual que se nota no design e nas construções modernas, é a natureza vista como um obstáculo banal a ser superado. Esse é um grande empecilho para a experiência profunda da natureza, considerando que “o novo habitat dos seres humanos é o ambiente interno projetado, construído em larga escala, distante em termos funcionais e materiais das características locais.” Neste quesito, prevalece comportamento de competição por posição social e bens materiais, com estilo de vida pautado na rapidez e recompensas. O desafio da biofilia é restabelecer a experiência satisfatória da natureza, diante do plano edificado, como uma possibilidade de suprir a distância entre homem e natureza.
Santos (2016) sustenta que a vida humana com saúde só é viável através do trabalho prestado pela Terra, que produz oxigênio e alimento ao ser humano, limpa a água e recebe luz solar. De fato, os problemas psicológicos, aumento do estresse, déficit de atenção e hiperatividade são desencadeados devido à falta de conexão com a natureza. De acordo com Andrade e Pinto (2017), nos ambientes urbanos é crescente o número de casos de estresse, doenças cardiovasculares e danos ao sistema imunológico, casos estes provocados por estressores nos ambientes antrópicos.
Muitos estudos apontam para experiências positivas aos estímulos da natureza, como o de Ulrich (1984), que compara 23 pacientes cirúrgicos acomodados em quartos com janelas com vista para um cenário natural, onde tiveram estadas hospitalares pós-operatórias mais curtas, receberam menos comentários de avaliação negativos nas anotações das enfermeiras e tomaram menos analgésicos potentes do que 23 pacientes em quartos semelhantes com janelas voltadas para um prédio. Nessa perspectiva, nota-se os benefícios da natureza para a saúde física e mental dos pacientes.
Compreendendo toda essa importância do processo natural para o bem-estar humano, retomando o elo perdido entre homem e natureza, verifica-se a necessidade da inserção de características biofílicas que agreguem ao projeto de interiores. As estratégias que podem ser adotadas desde o conceito inicial proposto em determinado ambiente, mesclando elementos naturais ao ambiente edificado, congregam o design biofílico.
Considerando que a maior parte das pessoas passa os dias em sua totalidade em ambientes internos, ao mesmo tempo em que busca hábitos saudáveis e melhora da saúde como um dos aspectos para melhor desenvolver e produzir no decorrer do dia, a integração à natureza passa a ser considerada elemento base nos projetos de interiores, tanto residenciais como comerciais.
O conceito do design biofílico vem da ideia de que 99% do desenvolvimento biológico humano é uma resposta direta das forças da natureza – gravidade, luz, ar, plantas, animais – e muito pouco de fontes artificiais como construções ou a tecnologia (BONI, 2018).
A purificação do ar e o melhor conforto térmico, deixando o ambiente mais fresco, são apenas algumas vantagens da inserção da vegetação nos ambientes internos. De acordo com Boni (2018), dentre os aspectos do design de Interiores que utilizam a biofilia, pode-se citar a melhora da saúde e bem-estar, envolvimento com a natureza, estimulando um sentido de relacionamento e responsabilidade para as comunidades humanas e naturais.
O projeto que contempla a biofilia, além de promover a melhoria do meio ambiente onde ele está inserido, aumenta a produtividade e um amplo espectro de benefícios físicos, mentais e comportamentais, diminuindo estresse e ansiedade, trazendo facilidade na resolução de problemas. Ou seja, maior índice de satisfação e motivação (BONI, 2018). Nesse ponto, vale ressaltar que a biofilia promove maior atenção e concentração; os ambientes que trabalham com vendas, por exemplo, teriam uma melhora significativa nos números.
O desenvolvimento das rotinas de trabalho em um ambiente que contempla o design biofílico, pode melhorar o desempenho do funcionário, assim como esses princípios podem incentivar os compradores a ficarem mais tempo em uma loja, e, portanto, gastarem mais. Assim, os ganhos com o design biofílico atingem todas as esferas em busca das sensações e percepção em dado espaço (Figura 2).
Figura 2 – Design Biofílico nos ambientes corporativos.
Fonte: https://www.ucarquitetura.com/blog-1/design-biofilico
Quando se fala na aproximação e amor à natureza atrelados à biofilia, o primeiro pensamento é incluir a vegetação nos projetos. No entanto, existem outros fatores a serem aplicados, como a iluminação natural. Há evidências crescentes de que somos mais saudáveis quando nossos ritmos circadianos são equilibrados, e ter acesso à boa luz do sol ajuda muito com isso. Intuitivamente, mapeamos a hora do dia observando as sombras e a luz do sol.
Quando estamos em ambientes artificialmente, não percebemos a mudança de horário, por isso o cérebro não recebe informação de que está anoitecendo e deixa de produzir melatonina, o hormônio que nos faz relaxar (RANGEL, 2018).
A ventilação natural dificilmente é aproveitada nos projetos de interiores, as cortinas e persianas dominam, não sendo abertas em nenhum momento do dia. Assim, não se obtêm o contato com a ventilação e sons externos. Rangel (2018) explica que, dependendo da localização do ambiente comercial, ter uma visão para o exterior, mesmo que com as janelas fechadas, traz conforto e segurança.
No entendimento de Kellert e Calabrese (2015), o desafio para aplicação do design biofílico é abordar as deficiências dos espaços urbanos contemporâneos, reencontrando a conexão das pessoas com a natureza. A proposta de uma cidade biofílica é criar um habitat para as pessoas que funcione como um organismo biológico, promovendo a saúde e o bem-estar dentro dos espaços construídos (LADISLAU, 2019).
Segundo Kellert e Calabrese (2015), é possível dividir a experiência com a natureza em três tipos: direta, indireta e de lugar. Contudo, o design biofílico deve ser incorporado em todas as escalas da construção, desde o planejamento da edificação, da ambientação interna, inclusive atingindo a paisagem do entorno, o espaço urbano.
Acompanhando as ideias propostas por esses autores, a experiência direta com a natureza refere-se ao contato real com o meio natural, que pode ser sentido no ambiente construído. Em tal contexto, importa a iluminação natural, a ventilação, a presença de água, o fogo, os animais, além da vegetação. Os animais podem ser atraídos pelo paisagismo trabalhado em torno do ambiente, ou mesmo com a presença dos pets, já permitidos em empresas de diversos ramos, fazendo parte do dia a dia dos funcionários. A vegetação no interior do ambiente pode ser incluída através de canteiros, jardins centrais e jardins verticais, formando belas paredes verdes, bem como vasos de materiais, cores, tamanhos e vegetação diversas. Dentre os elementos naturais, vale citar a importância da água, seja em forma de fontes, espelhos d’água, aquários, tanques, ou apenas a visão para um rio, lago ou mar, evocando aromas e sensações. De forma análoga, assim como a inserção da terra, ar e água no ambiente, Kellert e Calabrese (2017) evidenciam a importância do elemento fogo, com o uso das lareiras internas, trazendo conforto em lugares mais frios.
Nesse viés, a experiência indireta inclui tudo o que pode trazer as sensações da natureza, mesmo que de forma artificial, como imagens, quadros, estampas com paisagens, formas orgânicas e sinuosas, a simulação da luz externa, feita com dimerização das lâmpadas e formação de cenas no ambiente interno, geometrias naturais e aplicação da biomimética (Figura 3). Isto é, a representação da natureza ou sua transformação (KELLERT e CALABRESE, 2015).
Figura 3 – Design Biofílico. Fonte: arredare.com.br
Em que pesem as ideias sustentadas pelos autores supracitados, o terceiro tipo de experiência com a natureza no design biofílico é a experiência espacial ou de lugar, que se refere ao contato com características espaciais do ambiente natural e promove saúde e bem-estar humanos, sendo perspectiva e refúgio, complexidade organizada, integração das partes com o topo, espaço de transição, mobilidade e circulação, conexão cultural e ecológica local. Ambientes estes que trazem sensação de conforto e segurança, conexões visuais entre os espaços interiores e com o exterior, ambientes seguros e de abrigos e no exterior, como varandas, terraços e pátios, incluindo espaços de transição. Ambientes ricos em detalhes, mas de maneira ordenada e organizada, ligando todo o espaço e incluindo limites e pontos de caminho claramente compreendidos, promovem sentimento de conforto, segurança e mobilidade. Aproveitando a cultura e a ecologia locais, preservando paisagem, fauna, flora, climas e características do local.
No quesito composição e personificação do ambiente, de maneira similar, Boni (2018) destaca no estilo biofílico o uso de materiais naturais, como madeira e pedra, formas orgânicas no mobiliário e acabamentos, além da presença de água e vegetação. A ideia de trabalhar em um grande escritório de advocacia, em edifício localizado na região central da cidade, andar alto, avenida com trânsito intenso, mas se sentir confortável, seguro, com boa qualidade do ar, sons da natureza e iluminação natural, congrega conceitos do design biofílico, proporcionando vantagens psicológicas, físicas e emocionais. Isto é, a intervenção da natureza em prol do melhor desempenho do homem.
O Design biofílico é parte integrante de um design considerado sustentável, que congrega conforto térmico, acústico, uso dos materiais naturais, eficiência energética, bem como a preocupação com o ciclo do produto, interferindo diretamente no processo criativo de um espaço.
Os atributos são as ferramentas para se construir ambientes mais saudáveis e suas experiências biofílicas são experimentadas pelos sentidos humanos, através da visão de uma paisagem, do som da água ou farfalhar das folhas, da textura ao tocar as plantas, do movimento do ar, do aroma das flores e temperos, o sabor dos alimentos.
Observou-se a relevância da aplicação da biofilia como fundamento aos novos projetos de design de Interiores, verificando ser um tema interdisciplinar, envolvendo outras áreas que podem somar a este estudo inicial. Ao longo da história da humanidade, é possível perceber que, quanto mais o homem se afasta da natureza, maior a busca pela reintegração e conforto, procurando refazer esse elo perdido com o meio natural.
Em tal contexto, vale ressaltar que as sensações e percepções desencadeadas em um ambiente, é fator essencial para um projeto de design de Interiores, este, por sua vez, envolve elementos e princípios do design pautados pela ergonomia e normas vigentes. Assim, faz-se necessária a compreensão correta do briefing do indivíduo, buscando características inerentes a sua personalidade e o entendimento da psicologia das cores e formas, analisando o que isso pode refletir de maneira positiva na composição do ambiente.
O design biofílico cria espaços inspiradores a partir da experiência do homem com a natureza e os elementos que a compõem para trazer conforto e bem-estar no dia a dia, diminuindo os níveis de estresse e ansiedade, situação relevante e preocupante em que vive a população contemporânea. Dessa forma, a biofilia incorpora as dimensões da natureza, favorecendo a saúde e a produtividade, além da conexão social e ambiental. Aplicando as estratégias do design biofílico, a estética é apenas um dos fatores que soma ao design de Interiores, concluindo que é um fundamento fortemente ligado à sustentabilidade.
Ana Carla Fiirst dos Santos Porto, designer de interiores, docente atuante na graduação e na pós-graduação em Design de Interiores na UNIGRAN-Capital, MS, sendo coordenadora do curso Tecnologia em Design de Interiores.
Jucymaire da Silva Castilho Uema, engenheira civil e discente em Design de Interiores na UNIGRAN, MS.
Nádia Mattos Melo, designer de interiores, mestranda em Recursos Naturais, gestora da pós-graduação em Interiores e Lighting Design na UNIGRAN-Capital, MS.
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