Categories: Edição 02

Metaprojetos e Projeções

METAPROJETO E PROJEÇÕES

Análise do ensino da prática projetual em Design de Ambientes

Autor

Jéssica Cristina Franco Fuzeri

Orientador

Isabella Pontello Bahia, Ma.

Resumo

São nos ambientes de ensino que os futuros designers aprendem exercitar a projetação e a desenvolver um olhar crítico sobre o mercado no qual irão se inserir, e a Prática Projetual compreende esse momento de experimentação. Na atualidade, frente a um cenário complexo, é possível levantar o seguinte questionamento: o ensino de Design de ambientes tem acompanhado tais mudanças, atendendo às demandas mercadológicas? Assim, o artigo em questão, parte de um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), que tem por objetivo geral propor uma ação metaprojetual que contribua com o ensino da prática projetual em Design de Ambientes. A metodologia para desenvolvimento adotada foi a pesquisa exploratória, de abordagem do problema qualitativo e de natureza teórica. Para coleta de dados, foi utilizada a pesquisa bibliográfica, documental e entrevistas semi-estruturadas. Os resultados parciais da pesquisa compreendem a construção de reflexões acerca de um cenário ideal para o ensino da prática projetual.

Palavras-chave: Design de Ambientes. Educação. Metaprojeto. Mercado de Design.

1. Introdução

O projetar em Design de Ambientes consiste uma atividade multidisciplinar que visa identificar e solucionar os problemas entre o ser humano e o ambiente no qual ele está inserido. Para isso, faz-se o uso de procedimentos, técnicas e métodos que objetivam gerar uma solução projetual criativa e assertiva. O foco do projeto é, portanto, o usuário, peça chave do processo de Design.

As entregas projetuais dos designers de ambientes geralmente tratam-se da tangibilização de uma solução conceitual (ambientação). Porém, em função do cenário socioeconômico atual, do impacto das mudanças ocorridas nos últimos tempos e, consequentemente, das novas demandas da sociedade alterações em diversas áreas do conhecimento e da produção humana ocorrem. No Design podemos compreender que essas transformações resultam na ampliação, flexibilização e expansão das expertises da profissão. Assim, é possível que as entregas ultrapassem o tangível e possam ser relacionadas, por exemplo, com questões de cunho estratégico e de gestão.

São nos ambientes de ensino que os futuros designers aprendem exercitar a projetação (através da experimentação e da aplicação dos conhecimentos adquiridos) e a desenvolver um olhar crítico sobre a sociedade e o mercado no qual irão se inserir (ALVARES; GONTIJO, 2010; LANDIM, 2010). Sendo assim, ao considerar o ensino de Design como um processo de “aprender para criar e fazer” (learning by doing), é de suma importância que o exercício projetual seja atual, formando alunos aptos a sanar as demandas e necessidades do mercado de trabalho.

O curso de Design de Ambientes está inserido nas ciências sociais aplicadas e possui nível de formação bacharel, ou seja, tem por função preparar profissionais generalistas com sólidos conhecimentos técnicos e reflexivos sobre a base da profissão. Além de objetivar que o aluno explore a relação teoria x prática de forma que estes antecipem novas demandas e realizem reflexões críticas sobre o contexto em que estão inseridos (FRANCO; ARAÚJO, 2003).

Além de formar profissionais aptos a utilizar os processos, metodologias e ferramentas de design aprendidos durante o curso, tanto no desenvolvimento da atividade projetual quanto para auxílio na identificação de problemas e demandas de design (BARBOSA; MACIEL; MOREIRA, 2014; BAHIA, 2017). E, o que se espera dos egressos da Universidade são profissionais conscientes de seu papel na sociedade, bem como aptos a atender, de forma inovadora, às necessidades e demandas do mercado (FRANCO; ARAÚJO, 2003).

Deste modo, temos de um lado a realidade de uma Universidade, que trabalha com demandas que tocam a interface do usuário com o espaço, buscando desenvolver no aluno um olhar holístico do que envolve o ato de projetar. São exercitadas questões de nível operacional, tático, estratégico. As experimentações são realizadas através de tipologias variadas de projeto que possuem clientes reais ou fictícios. O processo é guiado por ferramentas e métodos que objetivam orientar à solução, e não engessá-las.

E de outro, o mercado de Design de Ambientes, que atende as mais variadas tipologias de projeto (desde residenciais, comerciais, empresariais, institucionais, industriais a efêmeros, externos). Porém, as demandas são prioritariamente voltadas à ambientação do espaço. Os projetos são executados por escritórios e profissionais autônomos, que possuem procedimentos projetuais próprios.

Nesse panorama, a fim de capacitar profissionais que atendam às requisições de mercado, mas não se limitem a elas, o ensino deve proporcionar uma sólida formação teórico-prática. Contudo, no senso comum, permeia a ideia da existência de uma lacuna entre o conhecimento teórico e sua aplicação prática no mercado (GUERRA, S.I; NASSIF et al, 2007). Afinal, quem nunca ouviu, ou até mesmo afirmou, o famoso adágio de que “na prática, a teoria é outra”?.

De acordo com Arrieiro (2002) e Nassif et al (2007), o ato de considerar a teoria e prática de maneira fragmentada e independente pode gerar profissionais com dificuldade de relacionar informações e conhecimentos já adquiridos com a experiência prática. A consequência deste fato se resume em profissionais que não se sentem aptos a atender efetivamente todas as demandas que lhes são ofertadas. Vale ressaltar que os debates sobre teoria e prática e sua integração no contexto educacional como fonte de geração de conhecimento não são recentes, e segundo Nassif et al (2007), isso tem sido objeto de discussão em fóruns, debates e encontros acadêmicos entre pesquisadores nas diversas áreas do saber.

Assim, este artigo compreende a síntese de uma monografia, que parte do pressuposto que é necessário traçar reflexões sobre a Prática Projetual em Design de Ambientes de forma a possibilitar uma melhor articulação com o mercado em design. E pretende, através da análise do ensino atual das disciplinas de prática projetual (disciplina responsável por exercitar o ato de projetar em Design), traçar reflexões sobre o cenário ideal, no qual a teoria e a prática estão alinhadas.

METODOLOGIA

O presente trabalho parte da necessidade de se compreender o processo de ensino da prática projetual em Design de Ambientes em uma Universidade e se este ensino está atendendo às demandas propostas pela sociedade/mercado. Assim, possui dois eixos temáticos que se cruzarão, sendo eles: ensino do design e prática profissional do design. Estes foram estudados e caracterizados a fim de se construir uma análise metaprojetual entre as duas frentes. Dessa forma, a pesquisa em questão pode ser classificada quanto ao objetivo como pesquisa exploratória, de abordagem do problema qualitativa e de natureza teórica.

O levantamento, análise dos dados coletados e as conexões entre mercado e academia foram feitos através do Metaprojeto, por entender que ele permite uma liberdade criativa e conceitual. O Metaprojeto é aqui descrito como uma metodologia pautada na reflexão crítica e preliminar sobre o próprio projeto, a partir de dados estrategicamente coletados, no qual a complexidade do projeto é analisada com o intuito de transformá-la em algo simples e manipulável (MORAES, 2010; VASSÃO, 2010).

Para o entendimento e a criação de um cenário (forma de consolidação do metaprojeto) do ensino ideal do futuro foram realizadas pesquisas bibliográficas, documentais, pesquisa desk e entrevistas semiestruturadas com professores da disciplina, alunos que têm ou tiveram contato com estágio e com profissionais do mercado de Design de Ambientes. A criação do cenário, bem como a projeção das demandas futuras de Design, permitirá reflexões, cuja função é auxiliar o ensino da prática projetual a “sair de uma situação indesejada para a mais desejada possível” (SIMON, 1970).

REVISÃO DE LITERATURA

O designer é o profissional responsável por buscar e projetar soluções práticas para as demandas da sociedade. Envolve tanto um processo de resolução de problemas, quanto um processo de busca de problemas ainda ocultos (BEST, 2012). O design é, portanto, considerado uma atividade multidisciplinar que reúne atributos da arte e da ciência, do intuitivo e do científico, cujo objetivo é proporcionar benefícios à sociedade. Segundo Bahia et al (2016, p.3):

O design cria sinais, redefine formas, agrega valor aos artefatos industriais e é capaz de transformar desejos do inconsciente em objetos materiais, resolver problemas, promover a experiência emocional, cognitiva e estética, assim como proporcionar o bem-estar do usuário, de maneira sistemática e criativa.

O design está inserido na vida das pessoas mais do que elas imaginam, estando presente no decorrer de todo o dia a dia delas (SITÔNIO, 2013). Desta maneira, compreender a atividade do Design essencialmente relacionada ao ato de projetar e apenas como desenvolvedor de produtos é uma visão míope da atividade e não compreende todas as expertises competentes ao designer (NICOLAU, 2013; BAHIA, 2017).

Dentre as diversas tipologias de Design encontra-se o Design de Ambientes que pode ser definido como uma atividade multidisciplinar que visa identificar e solucionar problemas entre humano e o ambiente, ou seja, o meio o qual está inserido (BAHIA, 2017). Cabe a este profissional, então, conceber propostas para os desafios da atual sociedade, sejam eles de ordem complexa ou cotidiana, buscando atender às necessidades de cada usuário e assim, gerar identidade, conexão, apropriação, bem-estar e qualidade de vida, transformando a ocupação e o uso do espaço (BARBOSA; MACIEL; MOREIRA, 2014).

1 A demanda é a necessidade de algum produto ou serviço que exija um esforço de alguém. É reconhecida como a procura, mesmo que não haja o consumo do serviço ou produto que está sendo procurado ou em demanda. E são também as oportunidades de atuação detectadas para o designer de ambientes, mesmo que estas não sejam absorvidas pelo mercado e pela sociedade em geral.

A interface de atuação com o espaço pode ocorrer em ambientes residenciais, empresariais, institucionais, industriais, arquitetônicos, efêmeros, externos e virtuais e essas soluções compreendem questões físicas e abstratas (BAHIA et al 2016; BAHIA, 2017; ABREU, 2015; FRANCO; ARAÚJO, 2003).

Entender que, desde o início, a profissão de Design passou por diversas mudanças na atividade que a levaram, então, rumo a um cenário complexo, permite levantar o seguinte questionamento: o ensino de Design tem acompanhado e abraçado tais mudanças, atendendo assim, todas as demandas mercadológicas? (NICOLAU, 2013; LANDIM, 2010; DA SILVA et al, 2012). E sobre isso, Landim (2010, p.15) traz um questionamento interessante ao indagar “até que ponto a formação acadêmica responde aos anseios da sociedade e do setor produtivo?”.

Portanto, com o intuito de manter o ensino atualizado à realidade, o mesmo deve passar por constantes análises, buscando não só o desenvolvimento e enriquecimento das competências ensinadas, mas principalmente mudanças significativas na formação para que acompanhem as exigências atuais da sociedade (MARTINS, 2007; MARQUES, 2010). Entende-se também, que a sociedade em que estamos inseridos muda constantemente, e consequentemente as demandas de design (MATTE, 2009).

O ensino do Design no Brasil possui diversas disciplinas que compõem a grade curricular. E, segundo Nicolau (2013), o critério de divisão por disciplinas é uma necessidade advinda do cenário contemporâneo complexo. Sendo o caráter interdisciplinar do Design evidente tanto na prática diária quanto nos estudos sobre a área (LANDIM, 2010). Uma vez que a interdisciplinaridade trabalha na complexidade ao visar romper com as fronteiras e barreiras das disciplinas, não apenas buscando integrar conteúdos, mas também trabalhar uma atitude de “busca, envolvimento, compromisso e reciprocidade diante do conhecimento” (MENEZES; FRANCISCO, 2009, p. 35).

Corroborando com isso, Alvares e Gontijo (2010), afirmam que o desenvolvimento de projetos com caráter interdisciplinar, além de possibilitar a integração e o diálogo entre diversas áreas de conhecimento, permite mesclar a teoria e a prática em design, o que é fundamental e intrínseco à atividade projetual de design. As disciplinas constituem-se tanto como de natureza teórica, a qual busca a reflexão e construção do pensamento crítico, quanto de natureza prática, na qual os conhecimentos adquiridos são aplicados em projetos fictícios (LANDIM, 2010).

As disciplinas teóricas buscam transformar percepções, representações ou conceitos, e criar um tipo peculiar de produto – hipóteses, teorias, leis, etc (ALVARES; GONTIJO, 2010). As disciplinas de caráter prático têm por finalidade fazer com que os alunos, utilizando-se de temáticas pré-estabelecidas, exercitem a forma de projetação, focando em aspectos subjetivos e teóricos para construção de projetos inovadores e criativos (LANDIM, 2010; BAHIA et al, 2016). Mesmo sendo disciplinas práticas possuem uma fundamentação teórica, uma vez que o desenvolvimento de um projeto gera conhecimentos, pois fazem uso da pesquisa como instrumento de levantamento de informações (FONTOURA, 2002).

A disciplina de prática projectual na graduação em Design tem por foco habituar os alunos a buscar respostas, por meio de análises e reflexões, novas e criativas soluções projetuais e tem por expectativa, por parte dos docentes, que o aluno aprenda a criar um olhar crítico sobre os aspectos comportamentais, culturais, teóricos e subjetivos que compõem a temática do projeto (LANDIM, 2010). Para isso, os temas abordados precisam ser condizentes com a prática profissional e, quando isso não acontece, pode direcionar profissionais aptos a projetar apenas à ficção.

A prática projetual é, portanto, considerada por muitos, como a espinha dorsal do curso de design, por sua importância e também por permitir a união entre a teoria e a prática (ALVARES; GONTIJO, 2010). Ao envolver os vários domínios do saber essas disciplinas dizem a respeito às questões relativas à cognição, processos de pensamentos, formações de conhecimento, além de convergir o social, a tecnologia, expressão visual, etc (OLIVEIRA, 2009; ALVARES; GONTIJO, 2010), fatores estes que podem sofrer alterações com o passar do tempo. Segundo Bahia et al (2016):

A prática projetual em design é uma disciplina que recebe significativo destaque nas grades curriculares dos cursos de design. Implica na aglutinação de diversos conteúdos ministrados ao longo do curso em uma experimentação teórico-prática. Compreende-se que esta disciplina confere aos designers em formação bases para o exercício prático da profissão, associados aos pré-requisitos normativos e metodológicos que orientam o desenvolvimento de soluções em design (BAHIA et al, 2016, p. 2).

Portanto, a disciplina utiliza-se de métodos como forma de orientar e direcionar os procedimentos dos alunos envolvidos no projeto através da aplicação prática (MERINO, 2014). E por mais que os métodos sejam usados para nortear e definir os processos de design, não são rígidos e imutáveis, conforme aponta Merino (2014), ao afirmar que o método projetual não é absoluto ou definitivo, mas modificável, pois ao aplicá-lo, é possível encontrar formas de melhorá-lo.

Em análise à essa atuação profissional, segundo Brasil (2014), pode-se perceber um grande crescimento no setor de design no Brasil se analisados os dados dos anos 2000. Esse crescimento vislumbra-se tanto do ponto de vista de mercado quanto de produção de conhecimento, tecnologias e educação. Em estudo realizado pelo Banco Bradesco (2017) foi apontado que o setor moveleiro residencial está cumprindo um importante trabalho no crescimento da economia brasileira (LIMA; TRIGO, 2017). E quando voltamos os olhos para as atuações de Design de Ambientes, a Fundação Getúlio Vargas² projeta que haverá a construção de mais de 13,7 milhões de domicílios entre 2015 – 2025, ou seja, um grande campo de atuação para a profissão.

Percebe-se uma diversidade de segmentos de design sendo representados no mercado. Inicialmente condicionado ao modelo oriundo da produção industrial, o Design atualmente passa a atuar também com grande ênfase no setor de serviços, difusão de informações e construção de significados (BRASIL, 2014). E segundo Nicolau (2013), no mundo fluido contemporâneo, não há mais ‘containers’ que prendem e limitam as profissões, enrijecendo-as. E ressalta-se que o papel do designer no mercado está alterando, quando se afirma que:

O design agora surge não só como um fator de diferenciação das organizações, mas também como uma questão determinante na forma de comunicação entre a empresa e o mercado onde se insere, destacando aspectos como identidade, qualidade e satisfação, que são condicionantes fundamentais para: manutenção e conquista de mercado; diferenciação de produtos e serviços; redução de custos envolvidos com a produção e preservação ambiental (BRASIL, 2014).

Assim, o ensino deve adequar-se para essas mudanças que ocorrem. Porém, Moraes (2010) afirma que as metodologias aplicadas até então nos cursos de design ainda são, em sua maioria, voltadas para o chamado “cenário estático³”. E propõe, então, a inserção do Metaprojeto como uma nova metodologia em resposta a complexidade contemporânea que, através da criação de cenários, permite que os designers trabalhem de forma mais ampla, por não levar em consideração apenas o produto final em si, mas seu entorno, além de seus inputs e outputs.

2 Nome do estudo: Cenários para Demanda Habitacional no Brasil, encomendado pelo Sindicato da Habitação (Secovi-SP).

3 Aqui defini-se como “cenário estático” o período anterior a Globalização (considerando grande parte do período moderno que antecedeu a globalização até a década de 1990).

Portanto, para análise e conexão de todos os temas que elucidam a pesquisa utilizou-se do Metaprojeto, aqui descrito como uma metodologia, pautada na reflexão crítica e preliminar sobre o próprio projeto, no qual a complexidade deste é analisada com o intuito de transformá-la em algo simples e manipulável (VASSÃO, 2010; MORAES, 2010). Pode-se elencar portanto, o caráter reflexivo do Metaprojeto como seu fator de diferenciação com relação a outras metodologias. É definido também como o processo de idealização, programação e esquematização do projeto e pesquisa para atingir determinado resultado (FINESTRALI e REYES, 2010).

Segundo Camargo (2015, p.4), o verbete meta + projeto significa “que vai além do projeto, que transcende o projeto, que faz uma análise crítica e reflexiva sobre o projeto”. Ou seja, não se diz apenas ao projeto convencional e sua metodologia, mas a uma forma de extrapolá-lo (TAMEKUNI, 2014; MORAES, 2010). É chamado por alguns autores como o “projeto do projeto” ou “design do design”, um método analítico, de reflexão e articulado que visa o levantamento de todos os recursos e informações necessários para o desenvolvimento do projeto (VASSÃO, 2010; MORAES, 2010; CAMARGO, 2015).

Fator determinante na fase de estruturação do problema, o Metaprojeto auxilia na coleta de informações relacionadas aos objetivos que se pretende alcançar, além de propor conexões antes não pensadas (MORAES, 2010; LUCCA, 2016). Envolve o planejamento da pesquisa e o próprio projeto. De modo simplificado, pode-se dizer, segundo Bittencourt (2015), que ele parte de um problema (algumas vezes ainda não identificado), passa pela parte de pesquisa e exploração de campos e conteúdos, culminando então em um cenário – que é dito como a consolidação do Metaprojeto.

Segundo Manzini e Jegóu (2004) estes cenários são um aporte para tomada de decisões por abordar diversas possibilidades do contexto. Ainda que hipotéticos, os cenários visam prospectar futuras demandas e a traçar diretrizes projetuais que atendam às solicitações das organizações/mercado de forma mais assertiva (MORAES, 2010; TAMEKUNI, 2014; CAMARGO, 2015).

Por cenário (ou cenários) entende-se como o local em que ocorrem os fatos, o espaço de representação de uma história e que ilustra uma ação. Segundo Moraes (2010), o cenário corresponde não apenas ao presente, mas relaciona-se ao futuro, uma vez que se determina o panorama e a paisagem que ocorre atualmente (cenário existente) ou que ocorrerão (cenário futuro) as ações, guiando para diretrizes voltadas às novas realidades vindouras, definindo os papéis das pessoas como atores sociais e culturais. Consoante a isso, Coral (2009, p. 108) explana que um cenário é a “construção de uma situação futura e dos acontecimentos que a definem a partir do quadro atual”. Portanto, entender o cenário atual, permite pressupor possíveis situações futuras e, assim, adaptar-se a fenômenos emergentes (CARVALHO et al, 2011).

De acordo com Ribas (2007, p. 4), os cenários podem ser estabelecidos como uma exposição aproximada de situações futuras possíveis e que estão condicionadas a mudanças no processo. Acerca disso, Faller e Almeida (2012), afirmam que os cenários são carregados de incertezas, possibilidades e julgamentos, que são traçados a partir de elementos predeterminados. Os cenários são, portanto, mutáveis e os apontamentos gerados não precisam ser totalmente assertivos, visto que são projeções futuras.

Os cenários criados a partir das pesquisas não necessariamente podem ou devem acontecer, pois são possibilidades. Como já se disse, eles visam a contribuir com o processo de projeto e tomadas de decisão, e estimulam a criatividade. É uma realidade imaginada e não necessariamente uma previsão futura (CAMARGO, 2015, p. 83).

Dentre os diversos benefícios da construção de cenários podemos elencar que eles ajudam no processo de entendimento do ambiente e suas influências, bem como na criação de valor e inovação; os cenários também ajudam a relacionar e conhecer as inter-relações existentes entre os fatores internos e externos do projeto e aglutinar elementos para a formulação de estratégias (KATO 2007).

Na perspectiva do Metaprojeto, a construção e planejamento de cenários vão além das metodologias tradicionais por serem compostas por diversas incertezas e projeções futuras, que podem ou não vir a se concretizar (FALLER; ALMEIDA, 2014). E não está necessariamente voltado para a solução do projeto ou a tangibilização de um produto, mas busca fornecer possíveis caminhos a inovação, constituindo-se em uma plataforma de reflexão e compartilhamento de ideias sobre um futuro possível (BITTENCOURT, 2012).

DESENVOLVIMENTO: A CONSTRUÇÃO DO CENÁRIO

Para a construção do Cenário do Ensino, entendeu-se que era necessário levantar dados teóricos – através de bibliografias, documentos e pesquisas desk, e dados da prática com os atores envolvidos no processo, acerca da disciplina de prática projetual e do mercado de design de ambientes. Para isso, realizou-se entrevistas com 4 professores da Prática, 4 profissionais designer de ambientes atuantes no mercado e 4 alunos que têm ou tiveram contato com estágio supervisionado.

Com relação ao ensino, buscou-se entender como a disciplina se estrutura, quais os processos ensinados, as entregas solicitadas, as formas de avaliação, e como é pensada a relação entre a academia e mercado de atuação. Com os profissionais de Design de ambientes era necessário entender quais são as demandas e tipologias atuais de mercado, quem são os clientes, como é o processo de projeto utilizado na prática profissional e como ocorrem as entregas. Com os alunos, por sua vez, foi possível levantar dados sobre as duas esferas (academia e mercado), através de dados sobre as demandas de mercado, o processo executado, diferenças e semelhanças entre o processo de projetação na universidade e no mercado.

Após o levantamento dos dados as análises obtidas sobre o cenário proposto são:

1. Quem são as pessoas (sociedade)? Observa-se que as pessoas estão cada vez mais digitais e conectadas procurando pelas novidades do mercado e que, através da internet, adquirem referências pessoais e por isso acreditam ter uma noção do que querem e gostam e algumas vezes buscam o designer como forma de garantir a assertividade e adequação a normas e legislação vigentes. Isso exige mais do designer como profissional, uma vez que ele não é o único detentor de informações. O mesmo deve buscar formas de se manter atualizado e deve imprimir nos ambientes uma grande carga simbólica, trazendo identidade e pertencimento aos espaços.

2. Como é a Universidade? A Universidade, sendo o local de experimentação dos alunos, trabalha com diversas tipologias de projetos de Design e, por mais que nem todas sejam absorvidas pelo mercado, acredita-se que são importantes para expandir o olhar do aluno e para criar repertório. É importante que os docentes sejam atuantes no mercado de Design.

Acredita-se que, com mais recursos aplicados para aumento do quadro de professores, seria possível criar disciplinas projetuais nas quais os professores podem imergir no processo individual de cada aluno e assim ajudar efetivamente nas dificuldades de cada aluno. Incentivos em projetos de caráter científico ou extensionista podem auxiliar no aumento da visibilidade da profissão perante a sociedade que ,em sua maioria, desconhece todas as expertises da profissão.

3. Quem demanda Design? Todos. Nem todas as demandas de Design são absorvidas pelo mercado, porém, elas existem. Através das diversas tipologias trabalhadas na Universidade e, através da construção do pensamento do Design, o designer torna-se capaz de solucionar problemas das mais diversas realidades e naturezas.

4. Quem são os designers? Atualmente o designer não é mais profissional responsável apenas pela construção de produtos tangíveis, e vê-lo desta forma é ter uma visão reducionista e míope da atividade. Com a expansão das expertises do Design áreas como a de gestão, de serviços e de atividades estratégicas estão surgindo como grandes ênfases de atuação.

Assim, trabalhar com a construção do pensamento do Design nas práticas projetuais torna-se essencial como forma de ampliar o olhar do aluno, contribuindo para a construção de uma visão holística e de um censo crítico sobre a profissão e sobre a sociedade ao qual está inserido.

5. Como ocorre o diálogo Design x Universidade? Foi possível perceber a importância de se trabalhar com clientes reais nas práticas projetuais, pois além de contribuírem para uma construção mais efetiva do briefing – elemento extremamente importante para o designer, é possível trabalhar com problemas e demandas reais e permite sua posterior validação, o que, por sua vez, ajuda a mostrar ao aluno se ele encontra-se no caminho correto.

Outro ponto a se refletir é sobre a importância de se trabalhar a disciplina de forma prática e não apenas metodológica, abarcando assim, etapas como o levantamento métrico e o acompanhamento de projetos, etapas amplamente presentes em um processo de projeto de Design. Processos individualizados, além de proporcionarem maior autonomia para os alunos, permite que os mesmos aprendam a realizar a gestão de seu tempo, distribuindo-o de acordo com as etapas que mais lhe demandam tempo e atenção.

CONCLUSÃO

Entende-se que pelo caráter de artigo científico o presente trabalho não esgota as reflexões acerca do processo da prática projetual em design de ambientes. Observa-se, ainda, que o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) está em desenvolvimento e que o conteúdo aqui apresentado consiste considerações parciais já levantadas. Entretanto, algumas questões já são nítidas e sinalizam caminhos férteis para o estudo e a reflexão em design de ambientes.

A primeira delas, trata-se do ruído de comunicação entre academia e mercado em design de ambientes. E a segunda, que academicamente os designers de ambientes, por possuírem momentos de experimentação e reflexão acerca da realidade, têm um olhar holístico de resolução de problemas, o que os torna aptos a projetar em demandas ainda pouco exploradas pelo mercado.

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VASSÃO, C. A. METADESIGN: Ferramentas, estratégias e ética para a complexidade. São Paulo: Blucher, 2010.

Currículo do autor

Jéssica Cristina Franco Fuzeri
Graduanda em Design de Ambientes pela Escola de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais (ED-UEMG). Atuou como pesquisadora e voluntária em projetos de caráter social e de expansão da visão do Design em diversos centros de pesquisa. Possui grande interesse em pesquisas voltadas à área de educação e que contribuam para valorização da profissão, e pesquisas correlacionadas com design social e interfases entre design e saúde.

Currículo do orientador

Isabella Pontello Bahia, Ma.
Designer de Ambientes, especialista em Inteligência de Mercado e mestre em Design. Atuação profissional em soluções de design na interface usuário – ambiente e gestão empresarial. Foi Agente Local de Inovação (ALI) do Sebrae-MG. Atual professora pesquisadora, integrante do Centro de Estudos em Design de Ambientes (CEDA) e Sub-Coordenadora do curso de Design de Ambientes da Universidade do Estado de Minas Gerais (ED-UEMG). É também diretora de planejamento da Volare.

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